quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

A História de um morto

Não que o trabalho nos deixe extasiados, mas naquela sexta, estava quente e confortável, na companhia dos amigos. Passou-se que o deslumbramento pelo trabalho falou mais alto que a vontade de voltar e voltamos apenas quando o trabalho não podia mais fazer-se acompanhado. Deixa-mo-lo descansar, como nós. Aproveitar o fim de semana!
Recolhemos os nossos pertences e fomos alegremente caminhando para o metro, cheio de gente com pressa e pessoas na correria do fim do dia, do fim da semana. Vazio de calma, de paz, vazio de silêncio. Lá fomos nós. Esperar pelo que nos leva a casa. Conversamos e passeamos, no meio de concertos e tempo apertado, apanhamos o comboio esperado, pontual. Entramos, quase no fim, naquele mar de gente sentada, mas especialmente de pé. Típica sexta feira. Malas e pastas e sacos. E pressa! Vontade de chegar ao lar, de ver a família e os amigos. Vontade de chegar.
Enquanto no entretimento da conversa sobre a vida e sobre as casas e os preços, sobre - sente-se algo por baixo de comboio. Grande, sólido. Havíamos sentido o passar por cima, de algo - as viagens longas e cheias de paciência, dos destinos, apenas no pouco tempo da longa viagem que se iniciava. Mas, e não posso precisar o espaço de tempo, que outrora se veio a confirmar longo, de imediato o comboio abranda e se instala o silêncio para logo começar o burburinho.

Alguém se matou!

Caiem por terra todas as esperanças de chegar a horas a casa, e o sentimento de lembrança começa a vir cada vez mais à memória. Aquela sensação estranha, que parecia um solavanco. Aquilo que ainda hoje não consigo descrever. Foi passar por cima de uma pessoa. Foi matar sonhos, matar esperanças. Matar não! Não se mata algo que já está morto, caso contrário não tomaria aquela atitude. Mas matar outros. Matar uma família, estilhaçar amigos, despedaçar possíveis filhos e desolar possíveis pais. Não foi só passar por cima de uma pessoa e mata-la. Foi devastar tudo o que a rodeava. Foi o culminar de uma decisão.
A medo, espreito para a rua, depois de umas quantas cabecinhas espreitarem, mas nada! Saímos e passamos pela frente do comboio e nada! Nada. Ninguém. Não percebemos de onde, já que estava escuro e a última estação por onde havíamos passado ainda ficava longe. Fez-se ouvir um longo apito da buzina do comboio, que apenas os atentos ouviram. Havia-se feito soar o aviso. Não sabemos como, mas aconteceu.
Ninguém falou de nada. Não sabemos quem era a pessoa, quem deixou. Vimos os policias com as pequenas lanternas, de expressões fechadas, calados. Mais uma noite de trabalho longo! Antes trabalhassem por outras razões...

Este foi o dia em que matei alguém. Mas nada pude fazer. Foi o dia que eu esperava nunca acontecer. Foi o dia. Um dia triste. Foi o dia que me fez pensar que a vida é demasiado nossa e preciosa, para deixar-mos que passem por cima de nós, que nos matem os sonhos e as esperanças. Foi o dia em que nunca mais deixei que me matassem com enganos!

terça-feira, 2 de outubro de 2012

Mentiras

Se tanta gente contasse tanta verdade como tantas as vezes que mente, seriamos todos muito mais e melhores uns para com os outros.
Se somente pudesse haver um bocadinho de esperança em cada mentira, toda a mentira se tornaria  um pouco verdade. E todo o pouco de verdade seria uma grande mentira.

Nota mental: Não confiar nos que as pessoas dizem. Não confiar no que as pessoas dizem.

domingo, 9 de setembro de 2012

A sorte

Às vezes pergunto-me se valerá mesmo apena.
Se valerão apena os momentos que vivemos sozinhos. Aqueles em que estamos sozinhos. Aqueles em que o coração aperta e dói mais que as lágrimas.
Pergunto-me se valerá realmente apena lutar pela verdade, quando todos acreditam na mentira. Se vale apena lutar por alguém que tem mais esqueletos no armário que eu. Mais fantasmas na cabeça que eu.

Mas alguém violou a minha privacidade... Leu o que queria, o que não queria, o que devia, mas acima de tudo o que não devia! Coisas que era muito pessoais, e que não se contam a todos os amigos.
Mas ninguém acredita na minha palavra. E se agora valerá apena conhecer a verdade, porque valerá se todos preferem acreditar na mentira? Se todos se escondem na mentira, perdidos nos esqueletos e fantasmas. Se todos confiam na mentira?! Por mais provas e por mais válidas que sejam, de que vale o serem, se a minha verdade vai ter sempre menos peso que a actual mentira?
De que vale, se é assim que se desmascaram vidas, se encontram mentirosos. Se percebe quem afinal os manipula e os engana. A eles, que um pouco de sorte encontraram em todos os armários sujos e cheios de pó. Encontraram a nossa sorte e levaram-na, para dela fazerem o que quiserem. Para nos vencerem com as suas mentiras. Para mascararem a mentira, enquanto nós lutamos com a nossa verdade.
Mas o dia da verdade há de chegar. O dia em que todos vão saber quem são eles. O dia em que todos vão saber quem eles são, os que são enganados e os mentirosos. Mas principalmente, o dia em que os enganados vão enfrentar os mentirosos e saber a verdade. O dia em que os enganados não podem passar para o lado da verdade. O dia em que os mentirosos vão para de rir e ter sorte.
O dia em que a sorte vão chegar a quem realmente tem muito lutado por ela.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

As Marionetas

No inicio éramos um. Éramos bons, fantásticos, maravilhosos, perfeitos.
Éramos coisa nunca feita, nunca antes experimentada.
Coisa rara, única. Milagre da sabedoria!
Éramos aplaudidos e elogiados. Ofuscados belo brilho do sucesso.
Mas, com o passar do tempo, deixou de ser assim.
A verdade passou a ser meias mentiras.
As coisas passaram a ser tudo por metade.
Metade do brilho, metade do sucesso.
Parecíamos marionetas com pó, esquecidas da multidão, mas lembradas por quem as fazia mexer, sempre mais e mais.
Levantamos o nossos braços de marionetas e sorrimos enquanto as nossas mãos trabalhavam alegremente.
Alegremente pensando num futuro risonho.
Mas aí, tudo começou a ser por um terço.
Um terço da raridade, um terço da experiência, um terço da permanência.
Agora, que somos três em vez de um, somos o Bom, o Mau e o Vilão.
E agora que só há hipótese para Bons e Maus, os Vilões aguardam ser arrumados para entrar em novas peças. Em novas cenas.
Serem manipulados por nova gente, em coisas novas, coisas diferentes.
E esquecer o passado, de marionetas, e passar a actuarem como gente como deve de ser.

segunda-feira, 19 de março de 2012

That's what I am

Sempre fui uma criança especial.
Sempre fui uma pessoa especial.
Sempre vivi com peso a mais, sempre fui a gorda, sempre fui o epicentro.
Sempre fui motivo de gozo e de risota.
Sempre esperei que uns ténis com luzes me fizessem mais feliz, mas esses ténis nunca chegaram.
Sempre pensei que as pequeninas PollyPocket viessem e escondessem o meu tamanho com a sua pequenez. Quando vieram, foi a mais pequena de todas, mas uma grande recordação, que ainda hoje não esqueço quem me a ofereceu.
Sempre tive o cabelo à tigela e nunca entendi porque é que me achava feiosa. Achava que era por ser gordinha que não era tão bonita como as outras meninas.
Na escola, toda a gente tinha namorados, mas eu era forte, e sabia que só precisava de amigos.
À medida que fui crescendo, escondi a vergonha do corpo que tinha e as marcas que nele só eu via, atrás de um feitio mau, de um egoísmo tal.
Hoje tenho inveja, porque nunca tive muitas coisas que todos os outros tiveram.
Nunca tive um mp3.
Nunca pude escolher com quem morar.
Nunca pude ir à discoteca com amigos.
Nunca tinha ido a um festival como todos os meus amigos tinham ido e que contavam as suas aventuras emocionados.
Eu nunca tive muitas coisas que os outros meninos tinham e que eu também queria ter. E não que isso justifique de alguma maneira o comportamento de hoje, mas eu queria ter sido uma menina normal.
Queria poder ter sido eu.
Queria poder não ter estes sentimentos maus, por só ter feito anos mais tarde o que toda a gente fez na idade certa.
Queria poder ter tido tudo isso, e não ter esta mágoa de ser a gordinha com quem nenhum menino queria namorar.
Mas no entanto eu sorria.
Se hoje eu sorrisse como dantes, quando não percebia nada, quando não sentia nada.
Quando achava que tudo se explicava por eu ser como os meus pais.
Quando eu troquei o amigo imaginário pelo papel.
Tudo foi tarde demais.
E hoje esta revolta que me abraça, enoja-me. Dói-me!
Mas é assim que sou.
Porque as lágrimas não vão trazer mais que dor. Não vão trazer nenhuma solução.
Não me vão dar tudo o que eu devia ter tido na devida altura, no tempo certo.
Nada nesta vida pode ser trocado pelas pequenas diferenças que eu sempre tive.
Nada pode substituir as memórias horríveis de negras fosse em que parte fosse.
Nada pode apagar as noites de horror e de medo, das mãos a tremer e da falta de ar.
Nada pode apagar todos os bocadinhos em que, com todas as minhas poucas forças, só desejava morrer.
Nada pode mudar o passado que devia ser encoberto e escondido. Cosido com lãs de cores alegres e fiozinhos de ouro.
Nada pode mudar os erros do passado.
Agora só posso mudar EU!