segunda-feira, 19 de março de 2012

That's what I am

Sempre fui uma criança especial.
Sempre fui uma pessoa especial.
Sempre vivi com peso a mais, sempre fui a gorda, sempre fui o epicentro.
Sempre fui motivo de gozo e de risota.
Sempre esperei que uns ténis com luzes me fizessem mais feliz, mas esses ténis nunca chegaram.
Sempre pensei que as pequeninas PollyPocket viessem e escondessem o meu tamanho com a sua pequenez. Quando vieram, foi a mais pequena de todas, mas uma grande recordação, que ainda hoje não esqueço quem me a ofereceu.
Sempre tive o cabelo à tigela e nunca entendi porque é que me achava feiosa. Achava que era por ser gordinha que não era tão bonita como as outras meninas.
Na escola, toda a gente tinha namorados, mas eu era forte, e sabia que só precisava de amigos.
À medida que fui crescendo, escondi a vergonha do corpo que tinha e as marcas que nele só eu via, atrás de um feitio mau, de um egoísmo tal.
Hoje tenho inveja, porque nunca tive muitas coisas que todos os outros tiveram.
Nunca tive um mp3.
Nunca pude escolher com quem morar.
Nunca pude ir à discoteca com amigos.
Nunca tinha ido a um festival como todos os meus amigos tinham ido e que contavam as suas aventuras emocionados.
Eu nunca tive muitas coisas que os outros meninos tinham e que eu também queria ter. E não que isso justifique de alguma maneira o comportamento de hoje, mas eu queria ter sido uma menina normal.
Queria poder ter sido eu.
Queria poder não ter estes sentimentos maus, por só ter feito anos mais tarde o que toda a gente fez na idade certa.
Queria poder ter tido tudo isso, e não ter esta mágoa de ser a gordinha com quem nenhum menino queria namorar.
Mas no entanto eu sorria.
Se hoje eu sorrisse como dantes, quando não percebia nada, quando não sentia nada.
Quando achava que tudo se explicava por eu ser como os meus pais.
Quando eu troquei o amigo imaginário pelo papel.
Tudo foi tarde demais.
E hoje esta revolta que me abraça, enoja-me. Dói-me!
Mas é assim que sou.
Porque as lágrimas não vão trazer mais que dor. Não vão trazer nenhuma solução.
Não me vão dar tudo o que eu devia ter tido na devida altura, no tempo certo.
Nada nesta vida pode ser trocado pelas pequenas diferenças que eu sempre tive.
Nada pode substituir as memórias horríveis de negras fosse em que parte fosse.
Nada pode apagar as noites de horror e de medo, das mãos a tremer e da falta de ar.
Nada pode apagar todos os bocadinhos em que, com todas as minhas poucas forças, só desejava morrer.
Nada pode mudar o passado que devia ser encoberto e escondido. Cosido com lãs de cores alegres e fiozinhos de ouro.
Nada pode mudar os erros do passado.
Agora só posso mudar EU!

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